segunda-feira, 30 de março de 2009

Sophia de Mello Breiner Andresen



"Quem és tu que assim vens pela noite adiante,
Pisando o luar branco dos caminhos,
Sob o rumor das folhas inspiradas?"

Vinicius de Moraes



Não é o grito
A medida do abismo?
Por isso eu grito
Sempre que cismo
Sobre tua vida
Tão louca e errada...
- Que grito inútil!
- Que imenso nada!

Oscar Wilde

"...Estou há quase dois anos na prisão. Durante esse tempo, meu temperamento me fez passar por momentos de selvagem desespero, de entrega total ao sofrimento, que era contristadora até para quem a observava, por uma raiva terrível e impotente, por sentimentos de amargura e rancor, por uma angústia que me fazia soluçar, um sofrimento que não encontrava palavras para expressar-se, um arrependimento mudo, um pesar silencioso. Passei por todos os estágios possíveis do sofrimento. Entendo melhor que o próprio Wordsworth o que ele quis dizer quando escreveu: "O sofrimento é algo permanente, misterioso e sombrio e tem a natureza do infinito."

domingo, 29 de março de 2009

Caio Fernando Abreu


Que eu não perca a capacidade de amar, de ver, de sentir. Que eu continue alerta. Que, se necessário, eu possa ter novamente o impulso do vôo no momento exato. Que eu não me perca, que eu não me fira, que não me firam, que eu não fira ninguém. Livra-me dos poços e dos becos de mim, Senhor. Que meus olhos saibam continuar se alargando sempre...

Caio Fernando Abreu, Em : Limite Branco.

José Saramago


Na ilha por vezes habitada do que somos, há noites,
manhãs e madrugadas em que não precisamos de
morrer.
Então sabemos tudo do que foi e será.
O mundo aparece explicado definitivamente e entra
em nós uma grande serenidade, e dizem-se as
palavras que a significam.
Levantamos um punhado de terra e apertamo-la nas
mãos.
Com doçura.
Aí se contém toda a verdade suportável: o contorno, a
vontade e os limites.
Podemos então dizer que somos livres, com a paz e o
sorriso de quem se reconhece e viajou à roda do
mundo infatigável, porque mordeu a alma até aos
ossos dela.
Libertemos devagar a terra onde acontecem milagres
como a água, a pedra e a raiz.
Cada um de nós é por enquanto a vida.
Isso nos baste.



José Saramago

sexta-feira, 27 de março de 2009

Ivan Lins


Sexta,
Dia que as Fantasias
Se vestem de Desejo.
Então, como um sussurro
eu queria ouvir...

"Quero sua risada mais gostosa
Esse seu jeito de achar
Que a vida pode ser maravilhosa

Quero sua alegria escandalosa
Vitoriosa por não ter
Vergonha de aprender como se goza

Quero toda sua pouca castidade
Quero toda sua louca liberdade
Quero toda essa vontade
De passar dos seus limites
E ir além,
E ir além...

Quero sua risada mais gostosa
Esse seu jeito de achar
Que a vida pode ser maravilhosa

Que a vida pode ser maravilhosa..."

Ivan Lins, Em: Vitoriosa.

Fernando Anitelli


"Meninas são bruxas e fadas,
Palhaço é um homem todo pintado de piadas!
Céu azul é o telhado do mundo inteiro,
Sonho é uma coisa que fica dentro do meu travesseiro!
(...)
Velhinhos são crianças nascidas faz tempo!
Com água e farinha eu colo figurinha e foto em documento!
Escola é onde a gente aprende palavrão...
Tambor no meu peito faz o batuque do meu coração!
Eu não sei na verdade quem eu sou ..."

quinta-feira, 26 de março de 2009

Marcelo Yuca




A minha alma
Está armada e apontada
Para a cara do sossego
Pois paz sem voz
Não é paz, é medo

Às vezes eu falo com a vida
Às vezes é ela quem diz
Qual a paz que eu não quero conservar
Pra tentar ser feliz

As grades do condomínio
São pra trazer proteção
Mas também trazem a dúvida
Se é você que está nessa prisão

Me abrace, me dê um beijo
Faça um filho comigo
Mas não me deixe
Sentar na poltrona
Num dia de domingo

Procurando novas drogas de aluguel
Nesse vídeo coagido
É pela paz que eu não quero seguir admitindo

quarta-feira, 25 de março de 2009

Belchior





Estava mais angustiado
Que um goleiro na hora do gol
Quando voce entrou em mim
Como um sol num quintal
Aí um analista amigo meu
Disse que desse jeito não vou ser feliz direito

Porque o amor é uma coisa mais profunda
Que um encontro casual
Aí um analista amigo meu
Disse que desse jeito não vou viver satisfeito

Porque o amor é uma coisa mais profunda
Que uma transa sensual

Deixando a profundidade de lado
Eu quero é ficar colado à pele dela noite dia
Fazendo tudo e de novo
Dizendo: Sim a paixao morando na filosofia
Eu quero gozar no seu céu
Pode ser no seu inferno
Viver a divina comédia humana
Onde nada é eterno
Ora - direis : ouvir estrelas,
Certo! Perdeste o senso
E eu vos direi no entanto
Enquanto houver espaço, corpo
Tempo e algum modo de dizer não, eu canto
Enquanto houver espaço , corpo
Tempo e algum modo de dizer não, eu canto...
(Divina Comédia Humana)

Imagem : Minotauro, Museu Do Louvre.

terça-feira, 24 de março de 2009

Antônio Bivar


" Era uma vez, mas eu me lembro como se fosse agora. Eu queria ser trapezista, minha paixão era o trapézio. Me atirava do alto na certeza que alguém segurava-me as mãos não me deixando cair. Era lindo, mas eu morria de medo, tinha medo de tudo quase: cinema, parque de diversão, de circo, ciganos, aquela gente encantada que chegava e seguia. Era disso que eu tinha medo. Do que não ficava pra sempre. Era outra vez outro parque, outro circo, ciganos e patinadores..."

Texto de Antônio Bivar, extraído do disco Drama 3°Ato/1973 de Maria Bethânia.

domingo, 22 de março de 2009

Clarice Lispector


"... Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre iria ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada. As vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo. Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante."

Clarice Lisperctor, Em: Felicidade Clandestina.

sábado, 21 de março de 2009

Carlos Drummond de Andrade




Mimosa boca errante
à superfície até achar o ponto
em que te apraz colher o fruto em fogo
que não será comido mas fruído
até se lhe esgotar o sumo cálido
e ele deixar-te, ou o deixares, flácido,
mas rorejando a baba de delícias
que fruto e boca se permitem, dádiva.

Boca mimosa e sábia,
impaciente de sugar e clausurar
inteiro, em ti, o talo rígido
mas varado de gozo ao confinar-se
no limitado espaço que ofereces
a seu volume e jato apaixonados
como podes tornar-te, assim aberta,
recurvo céu infindo e sepultura?

Mimosa boca e santa,
que devagar vais desfolhando a líquida
espuma do prazer em rito mudo,
lenta-lambente-lambilusamente
ligada à forma ereta qual se fossem
a boca o próprio fruto, e o fruto a boca,
oh chega, chega, chega de beber-me,
de matar-me, e, na morte, de viver-me.

Já sei a eternidade: é puro orgasmo.


Carlos Drummond de Andrade, Em: Amor Natural.

João Cabral de Melo Neto





Desordem na alma
que se atropela
sob esta carne
que transparece.

Desordem na alma
que de ti foge,
vaga fumaça
que se dispersa,

informe nuvem
que de ti cresce
e cuja face
nem reconheces.

Tua alma foge
como cabelos,
cunhas, humores,
palavras ditas

que não se sabe
onde se perdem
e impregnam a terra
com sua morte.

Tua alma escapa
como este corpo
solto no tempo
que nada impede.

Procura a ordem
que vês na pedra:
nada se gasta
mas permanece.

Essa presença
que reconheces
não se devora
tudo em que cresce.

Nem mesmo cresce
pois permanece
fora do tempo
que não a mede,

pesado sólido
que ao fluido vence,
que sempre ao fundo
das coisas desce.

Procura a ordem
desse silêncio
que imóvel fala:
silêncio puro.

De pura espécie,
voz de silêncio,
mais do que a ausência
que as vozes ferem.

João Cabral de Melo Neto, Pe.quena Ode Mineral

sexta-feira, 20 de março de 2009

Manuel Bandeira


Um vaga-lume abateu sobre as hortênsias e ali ficou luzindo misteriosamente

À parte as águas de um córrego contavam a eterna história sem começo nem fim.

Havia uma paz em tudo isso...

Tudo isso era tão tranquilo... tão simples... E deverias dizer que foi o teu momento mais feliz...



Teu corpo,
A única ilha
No oceano
Do meu desejo.

De tudo o que não sou, gozo tudo o que invejo.

— Quero a delícia de poder sentir as coisas mais simples.


Um dia serei feliz?
Sim, mas não há de ser já.

É o silêncio da tua carne.
da tua carne de âmbar, nua,
Quase a espiritualizar-se.

Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho (Recife, 19 de abril de 1886 — Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1968) foi um poeta, crítico literário e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro.

Arnaldo Antunes





O buraco do espelho está fechado
Agora eu tenho que ficar aqui
Com um olho aberto, outro acordado
No lado de lá onde eu caí

Pro lado de cá não tem acesso
Mesmo que me chamem pelo nome
Mesmo que admitam meu regresso
Toda vez que eu vou a porta some

A janela some na parede
A palavra de água se dissolve
Na palavra sede, a boca cede
Antes de falar, e não se ouve
Já tentei dormir a noite inteira
Quatro, cinco, seis da madrugada
Vou ficar ali nessa cadeira
Uma orelha alerta, outra ligada

O buraco do espelho está fechado
Agora eu tenho que ficar agora
Fui pelo abandono abandonado
Aqui dentro do lado de fora




Arnaldo Antunes

quinta-feira, 19 de março de 2009

Garfield

Teorias de Um Malandro

Eu adoraria as manhãs, se elas começassem mais tarde!

Eu odeio Segunda - Feira!

O que é uma dieta? Uma dieta é auto-negação; afortunadamente, tenho um coração tão bom, que não tenho coragem para me negar seja o que for.

Qualquer movimento em falso que faças na direcção da minha comida te pode meter em problemas, rapaz.

Hoje vou partilhar com outros... assim que encontrar outros com coisas que eu queira.

Dormir abre-me o apetite, comer faz-me sono... a vida é bela.

Ele é realmente hilário...

Mayakowski


Clara é minha visão
com toda a claridade
de uma alucinação.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Manoel de Barros

Eu não caminho para o fim, eu caminho para as origens.


Aquele homem falava com as árvores e com as águas
ao jeito que namorasse.
Todos os dias
ele arrumava as tardes para os lírios dormirem.
Usava um velho regador para molhar todas as
manhãs os rios e as árvores da beira.
Dizia que era abençoado pelas rãs e pelos
pássaros.
A gente acreditava por alto.
Assistira certa vez um caracol vegetar-se
na pedra.
mas não levou susto.
Porque estudara antes sobre os fósseis lingüísticos
e nesses estudos encontrou muitas vezes caracóis
vegetados em pedras.
Era muito encontrável isso naquele tempo.
Ate pedra criava rabo!
A natureza era inocente.



Deixei uma ave me amanhecer...


Escrever em Absurdez faz causa para poesia
Eu falo e escrevo Absurdez.
Me sinto emancipado.


Manoel Wenceslau Leite de Barros nasceu em Cuiabá (MT) no Beco da Marinha, beira do Rio Cuiabá, em 19 de dezembro de 1916.

Homer Simpson


"Bart, com US$ 10.000 nós seremos milionários. Nós poderíamos comprar todo tipo de coisas úteis como… amor"

"Sair de casa para quê? De qualquer forma, vamos acabar voltando para casa"


"A culpa é minha e eu a coloco em quem eu quiser"


"Existem três frases curtas que levarão sua vida adiante: 'Não diga que fui eu', 'Oh, boa idéia chefe' e 'Já estava assim quando cheguei'"

"Por favor, não me levem, eu tenho mulher e filhos... levem eles"

"Quando eu vejo os sorrisos nas faces das crianças, eu sei que elas estão aprontando alguma coisa"

terça-feira, 17 de março de 2009

Margaret Mitchel


"...A vida sempre me pareceu uma sombra projetada
em uma cortina, e era assim que me agradava! Procurava
afastar de mim tudo o que não fosse vago... pessoas...coisas
demasiado definidas e vitais. Antes da guerra, a vida era bela!
Continha o esplendor, a perfeição, a inteireza e a simetria da arte helênica"

Ashley, Em ...E O Vento Levou.

Margaret Munnerlyn Mitchell (8 de Novembro de 1900, Atlanta, Geórgia,16 de Agosto de 1949.

Vinícius de Moraes


Quando os lobos uivam e as sereias desacordadas se amontoam pelas praias – mulher!
Mulher que eu amo, criança que amo, ser ignorado, essência perdida num ar de inverno.
Não me deixes morrer!... eu, homem – fruto da terra – eu, homem – fruto da carne
Eu que carrego o peso da tara e me rejubilo, eu que carrego os sinos do sêmen que se rejubilam à carne
Eu que sou um grito perdido no primeiro vazio à procura de um Deus que é o vazio ele mesmo!
Não me deixes partir... – as viagens remontam à vida!... e por que eu partiria se és a vida, se há em ti a viagem muito pura
A viagem do amor que não volta, a que me faz sonhar do mais fundo da minha poesia...

Vinícius de Moraes, Em Antologia Poética.

segunda-feira, 16 de março de 2009

José Saramago


De que sedas se fizeram os teus dedos,
De que marfim as tuas coxas lisas,
De que alturas chegou ao teu andar
A graça da camurça com que pisas.
De que amoras maduras se espremeu
O gosto acidulado do teu seio,
De que Índias o bambu da tua cinta,
O oiro dos teus olhos, donde veio.
A que balanço de onda vais buscar
A linha serpentina dos quadris,
Onde nasce a frescura dessa fonte
Que sai da tua boca quando ris.
De que bosques marinhos se soltou
A folha de coral das tuas portas,
Que perfume te anuncia quando vens
Cercar-me de desejo a horas mortas.

José Saramago, Inventário, Poemas Possíveis.

domingo, 15 de março de 2009

José de Alencar


"Era serpente que enlaçava a presa nas suas mil voltas, triturando-lhe o corpo; era vertigem que vos arrebatava à consciência da própria existência, alheava um homem de si e o fazia viver mais anos em uma hora do que em toda a sua vida.

José de alencar, em Lucíola.

Vicente de Carvalho


A Flor e A Fonte

"Deixa-me,fonte!"Dizia
A flor,tonta de terror.
E a fonte,sonora e fria,
Cantava,levando a flor.

"Deixa-me,deixa-me,fonte!"
Dizia a flor a chorar:"Eu fui nascida no monte...
"Não me leves para o mar".

E a fonte,rápida e fria,
Com um sussurro zombador,
Por sobre a areia corria,
Corria levando a flor.

"Ai,balanços do meu galho,
"Balanços do berço meu;
"Ai,claras gotas de orvalho
"Caídas do azul do céu!..."

Chorava a flor,e gemia,
Branca,branca de terror,
E a fonte, sonora e fria
Rolava,levando a flor.

Imagem: Teatro Moulin Rouge - Paris

Clarice Lispector

"Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever."

sábado, 14 de março de 2009

Federico Garcia Lorca



Amor de minhas entranhas, morte viva,
em vão espero tua palavra escrita
e penso, com a flor que se murcha,
que se vivo sem mim quero perder-te.

O ar é imortal. A pedra inerte
nem conhece a sombra nem a evita.
Coração interior não necessita
o mel gelado que a lua verte.

Porém eu te sofri. Rasguei-me as veias,
tigre e pomba, sobre tua cintura
em duelo de kordiscos e açucenas.

Enche, pois, de palavras minha loucura
ou deixa-me viver em minha serena
noite da alma para sempre escura.

Federico Garcia Lorca


De manhã cedo, ao abrir-se
Rubra como sangue está.
Pela tarde fica branca,
De um branco de espuma e sal.
Quando a noite vem baixando,
Principia a desfolhar-se...

sexta-feira, 13 de março de 2009

Zé Ramalho


Há dias que eu me sinto assim...

" ... Eu desço dessa solidão, espalho coisas sobre um chão de giz
Há meros devaneios tolos a me torturar,
Há tantas violetas velhas sem um colibri..."

Alguém viu o meu colibri?

quinta-feira, 12 de março de 2009

Isabella Taviani


Quero beber, o que dele
Escorre pela pele
E nunca mais esfriar
Minha febre...

Bennor


Dobro os joelhos e oro ao pai
E conto pra Ele como o mundo vai
Mas não adianta eu orar e clamar
Se dentro de mim nada se transformar.

Manuel Bandeira


Vou lançar a teoria do poeta sórdido.
Poeta sórdido:
Aquele em cuja poesia há a marca suja da vida.
Vai um sujeito.
Sai um sujeito de casa com a roupa de brim branco muito bem engomada, e na primeira esquina passa um caminhão, salpica-lhe o paletó ou a calça de uma
nódoa de lama:

É a vida.

O poema deve ser como a nódoa no brim:
Fazer o leitor satisfeito de si dar o desespero.
Sei que a poesia é também orvalho.
Mas este fica para as menininhas, as estrelas alfas,
as virgens cem por cento e as amadas que
envelheceram sem maldade.

Khalil Gilbran



O amor que se não se
renova a cada dia torna- se
um hábito, e o hábito, uma
escravidão...

quarta-feira, 11 de março de 2009

Carlos Drummond de Andrade




A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em metades
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

terça-feira, 10 de março de 2009

Chesterton

Acredito em fadas, mas acho que as minhas se
perderam pelo caminho...
Volto a sonhar com elas cada vez que acho um
texto assim:

" ... Num conto de fadas há uma incompreensível felicidade que depende de uma incompreensível condição. Uma caixa é aberta, e todos os males saem voando. Uma palavra é esquecida, e cidades desaparecem. Uma lâmpada é acesa, e o amor voa para longe. Uma flor é arrancada, e vidas humanas perecem. Uma maçã é comida, e esvai-se a esperança em Deus.
Num conto de fadas há uma incompreensível felicidade que depende de uma incompreensível condição. Uma caixa é aberta, e todos os males saem voando. Uma palavra é esquecida, e cidades desaparecem. Uma lâmpada é acesa, e o amor voa para longe. Uma flor é arrancada, e vidas humanas perecem. Uma maçã é comida, e esvai-se a esperança em Deus..."

segunda-feira, 9 de março de 2009

Renato Russo

Quem inventou o amor?
Me explica,
Por favor?

Caio Fernando Abreu

E aí de repente sonho que recebo uma carta anônima. Só meu
coração desconfia de quem pode ser, nesta hora, ele também
imagina que o amor que foi soterrado dentro de mim, ainda pode
ter um resquício de vida embaixo dos escombros da minha alma.

"Tenho trabalhado tanto, mas penso sempre em você. Mais de tardezinha que de manhã, mais naqueles dias que parecem poeira assentada aos poucos e com mais força enquanto a noite avança. Não são pensamentos escuros, embora noturnos. Tão transparentes que até parecem de vidro, vidro tão fino que, quando penso mais forte, parece que vai ficar assim clack! e quebrar em cacos, o pensamento que penso de você. Se não dormisse cedo nem estivesse quase sempre cansado, acho que esses pensamentos quase doeriam e fariam clack! de madrugada e eu me veria catando cacos de vidro entre os lençóis. Brilham, na palma da minha mão. Num deles, tem uma borboleta de asa rasgada. Noutro, um barco confundido com a linha do horizonte, onde também tem uma ilha. Não, não: acho que a ilha mora num caquinho só dela. Noutro, um punhal de jade. Coisas assim, algumas ferem, mesmo essas que são bonitas. Parecem filme, livro, quadro. Não doem porque não ameaçam. Nada que eu penso de você ameaça. Durmo cedo, nunca quebra.
Daí penso coisas bobas quando, sentado na janela do ônibus, depois de trabalhar o dia inteiro, encosto a cabeça na vidraça, deixo a paisagem correr, e penso demais em você. Quando não encontro lugar para sentar, o que é mais freqüente, e me deixava irritado, descobri um jeito engraçado de, mesmo assim, continuar pensando em você. Me seguro naquela barra de ferro, olho através das janelas que, nessa posição, só deixam ver metade do corpo das pessoas pelas calçadas, e procuro nos pés daquelas aqueles que poderiam ser os seus. (A teus pés, lembro.). E fico tão embalado que chego a me curvar, certo que são mesmo os seus pés parados em alguma parada, alguma esquina. Nunca vejo você - seria, seriam? Boas e bobas, são as coisas todas que penso quando penso em você. Assim: de repente ao dobrar uma esquina dou de cara com você que me prega um susto de mentirinha como aqueles que as crianças pregam umas nas outras. Finjo que me assusto, você me abraça e vamos tomar um sorvete, suco de abacaxi com hortelã ou comer salada de frutas em qualquer lugar. Assim: estou pensando em você e o telefone toca e corta o meu pensamento e do outro lado do fio você me diz: estou pensando tanto em você. Digo eu também, mas não sei o que falamos em seguida porque ficamos meio encabulados, a gente tem muito pudor de parecer ridículos melosos piegas bregas românticos pueris banais. Mas no que eu penso, penso também que somos meio tudo isso, não tem jeito, é tudo que vamos dizendo, quando falamos no meu pensamento, é frágil como a voz de Olívia Byington cantando Villa-Lobos, mais perto de Mozart que de Wagner, mais Chagal que Van Gogh, mais Jarmush que Win Wenders, mais Cecília Meireles que Nelson Rodrigues.
Tenho trabalhado tanto, por isso mesmo talvez ando pensando assim em você. Brotam espaços azuis quando penso. No meu pensamento, você nunca me critica por eu ser um pouco tolo, meio melodramático, e penso então tule nuvem castelo seda perfume brisa turquesa vime. E deito a cabeça no seu colo ou você deita a cabeça no meu, tanto faz, e ficamos tanto tempo assim que a terra treme e vulcões explodem e pestes se alastram e nós nem percebemos, no umbigo do universo. Você toca minha mão, eu toco na sua.
Demora tanto que só depois de passarem três mil dias consigo olhar bem dentro dos seus olhos e é então feito mergulhar numas águas verdes tão cristalinas que têm algas na superfície ressaltadas contra a areia branca do fundo. Aqualouco, encontro pérolas. Sei que é meio idiota, mas gosto de pensar desse jeito, e se estou em pé no ônibus solto um pouco as mãos daquela barra de ferro para meu corpo balançar como se estivesse a bordo de um navio ou de você. Fecho os olhos, faz tanto bem, você não sabe. Suspiro tanto quando penso em você, chorar só choro às vezes, e é tão freqüente. Caminho mais devagar, certo que na próxima esquina, quem sabe. Não tenho tido muito tempo ultimamente, mas penso tanto em você que na hora de dormir vezemquando até sorrio e fico passando a ponta do meu dedo no lóbulo da sua orelha e repito repito em voz baixa te amo tanto dorme com os anjos. Mas depois sou eu quem dorme e sonha, sonho com os anjos. Nuvens, espaços azuis, pérolas no fundo do mar. Clack! como se fosse verdade, um beijo."

domingo, 8 de março de 2009

Simone de Beauvoir

Não se nasce mulher: Torna-se.

Cláudia alencar


Hoje há o amor fast-food, fica e tchau. Sou clássica, quero ser tratada como deusa.

Abelhas



"Não é digno de comer o mel, aquele que tem medo de umas picadelas"

Clarice Lispector


Porque eu me imaginava mais forte.
Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado:
pensava que, somando as compreensões, eu amava.
Não sabia que, somando as incompreensões, é que se ama verdadeiramente.

Marguerite Yourcenar

O nosso maior erro consiste em tentarmos colher de cada pessoa em particular as virtudes que elas não têm, e de nos esquecermos de cultivar as que de fato são suas.

Martha Medeiros


Sou tantas que mal consigo me distinguir. Sou estrategista, batalhadora, porém traída pela comoção. Num piscar de olhos fico terna, delicada.

Lya Luft

Para todas as mulheres... Mais cedo ou mais tarde nos enxergamos nesse texto:

Canção na plenitude

Não tenho mais os olhos de menina
nem corpo adolescente, e a pele
translúcida há muito se manchou.
Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura
agrandada pelos anos e o peso dos fardos
bons ou ruins.
(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)

O que te posso dar é mais que tudo
o que perdi: dou-te os meus ganhos.
A maturidade que consegue rir
quando em outros tempos choraria,
busca te agradar
quando antigamente quereria
apenas ser amada.
Posso dar-te muito mais do que beleza
e juventude agora: esses dourados anos
me ensinaram a amar melhor, com mais paciência
e não menos ardor, a entender-te
se precisas, a aguardar-te quando vais,
a dar-te regaço de amante e colo de amiga,
e sobretudo força — que vem do aprendizado.
Isso posso te dar: um mar antigo e confiável
cujas marés — mesmo se fogem — retornam,
cujas correntes ocultas não levam destroços
mas o sonho interminável das sereias.

sábado, 7 de março de 2009

Caio Fernando Abreu


" ... Quando nada mais houver,
eu me erguerei cantando,
saudando a vida
com meu corpo de cavalo jovem.

E numa louca corrida
entregarei meu ser ao ser do Tempo
e a minha voz à doce voz do vento.."

Imagem: Jardim Luxemburgo - Paris.

Adriana Calcanhoto

Tenho a idade que tenho
Tenho a idade dos sonhos
das ilusões
dos empates
perdas e
vitórias.
Tenho a idade das flores
dos bosques e
florestas.
Tenho a idade das aves
das pipas que se perdem no
espaço
dos dias chuvosos e
ensolarados
das noites escuras
e de lua cheia.
Tenho a idade que quero ter
a idade que deixo entrever ...

sexta-feira, 6 de março de 2009

Gilberto Gil


Noite de lua, Sexta - Feira e uma
música a me acompanhar:

" Há de surgir
Uma estrela no céu
Cada vez que ocê sorrir
Há de apagar
Uma estrela no céu
Cada vez que ocê chorar

O contrário também
Bem que pode acontecer
De uma estrela brilhar
Quando a lágrima cair
Ou então
De uma estrela cadente se jogar
Só pra ver
A flor do seu sorriso se abrir

Hum!
Deus fará
Absurdos
Contanto que a vida
Seja assim
Sim
Um altar
Onde a gente celebre
Tudo o que Ele consentir ..."

João Donato


Hoje eu acordei saudosa. Por coincidência um amor
antigo ligou pra mim e isso foi suficiente pra me
fazer recordar da música que tocava no acampamento
onde nos conhecemos:

" Não sei se foi
A canção de amor que entrou no ar
Não sei se foi o luar que deitou lá no céu
Se foi a onda do mar que quebrou meu coração
Se foi meu sorriso ou o toque precioso da mão

Só sei que foi
foi só pedir a quem se entregava assim
Depois tomar
O que eu já te dava de mim
Como entender as surpresas que o amor de repente nos faz
Foi só sentir o teu rosto tão perto demais

E o teu beijo com gosto de quero mais
Foi só sentir o teu corpo e cair pra trás
Não sei se foi a canção... "

quinta-feira, 5 de março de 2009

Dinho * Capital Inicial

Meu casamento comigo mesmo está em crise.
Deito-me porque estou cansada,
Acordo porque tenho que trabalhar.
Sinto falta da sensação de querer.
Sinto falta ...
Ouvi essa música hoje de manhã,
E invejei o sentimento do autor.


"Às vezes acho
Que eu fiquei louco
Me dando conselhos
Até ficar rouco
Às vezes acho
Que perdi a memória
Contando de novo
A mesma história...

Aqui onde as horas não passam
Aqui onde o Sol não me vê
Aqui onde eu não moro
Não existo sem você...

Me olho no espelho
E me vejo do avesso
O mesmo rosto
Que eu não reconheço
O rádio ligado
Chuva e calor
As gotas me ferem
Mas não sinto dor...

Aqui onde as horas não passam
Aqui onde o Sol não me vê
Aqui onde eu não moro
Não existo sem você..."

quarta-feira, 4 de março de 2009

Gandhi


"Se eu pudesse deixar algum presente a você, deixaria aceso o sentimento de amor' à vida dos seres humanos. A consciencia de aprender tudo o que nos foi ensinado pelo tempo afora. Lembraria os erros que foram cometidos, como sinais para que não mais se repetissem. A capacidade de escolher novos rumos. Deixaria para você, se pudesse, o respeito aquilo que é indispensavel: alem do pão o trabalho e a acao. E, quando tudo mais faltasse, para você eu deixaria, se pudesse, um segredo. O de buscar no interior de si mesmo a resposta para encontrar a saida."
(Gandhi)

terça-feira, 3 de março de 2009

Caetano Veloso


Gosto de sentir a minha língua roçar
A língua de Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar
A criar confusões de prosódias
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da rosa no Rosa
E sei que a poesia está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade ...

Pablo Neruda



... Sim Senhor, tudo o que queira, mas são as palavras as que cantam, as que sobem e baixam ... Prosterno-me diante delas... Amo-as, uno-me a elas, persigo-as, mordo-as, derreto-as ... Amo tanto as palavras ... As inesperadas ... As que avidamente a gente espera, espreita até que de repente caem ... Vocábulos amados ... Brilham como pedras coloridas, saltam como peixes de prata, são espuma, fio, metal, orvalho ... Persigo algumas palavras ...

segunda-feira, 2 de março de 2009

Alberto Caeiro


" ... O meu olhar é nítido como um girassol, Tenho o costume de andar pelas estradas. Olhando para a direita e a esquerda. E de vez em quando olhando para trás..."

João Cabral de Melo Neto

O mar soprava sinos,
Os sinos secavam as flores,
As flores eram cabeças de santos.

Minha memória cheia de palavras,
Meus pensamentos procurando fantasmas
Meus pesadelos atrasados de muitas noites.

De madrugada, meus pensamentos puros
Voavam como telegramas;
E nas janelas acesas toda a noite...

domingo, 1 de março de 2009

Uma travessia dentro de mim...


Achei esse texto, no: Cadinho RoCo – Jeito outro de ler a vida.
E como hoje, Inicio uma nova caminhada, uma travessia dentro de mim,
um casamento comigo mesmo, vivido pela primeira vez em um espaço que só
eu existo, então, acho que esse texto traduz bem esse meu momento:

"No silencio do barco rio bate no casco que corta água e vai segue seu rumo. No vento do navegar ideia voa em sensação que corta vida e vai segue seu rumo. Lá no longe do rio lugar escondido de tudo pra que dia passe num descanso manso e quieto. A madeira do casco range daqui e dali é barulhinho gostoso aconchegante, sugestão de coisas todas se ajeitando no fundo da vida."