sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Fernando Pessoa

"... Como é por dentro outra pessoa
Quem é que o saberá sonhar?
A alma de outrem é outro universo
Com que não há comunicação possível,
Com que não há verdadeiro entendimento.

Nada sabemos da alma
Senão da nossa;
As dos outros são olhares,
São gestos, são palavras,
Com a suposição de qualquer semelhança
No fundo...'

domingo, 23 de agosto de 2009

Paulo Leminski




Escrevo.

E pronto.

Escrevo porque preciso,

Preciso porque estou tonto.

Ninguém tem nada com isso.

Escrevo porque amanhece,

E as estrelas lá no céu

Lembram letras no papel,

Quando o poema me anoitece.

A aranha tece teias.

O peixe beija e morde o que vê.

Eu escrevo apenas.

Tem que ter por quê?

sábado, 22 de agosto de 2009

Marcos Cesar Mello


"... Olha, você parece um morango doce. Daqueles que eu gosto. Aliás, vem aqui comigo comer morangos frescos? A gente pode esquecer do que acontece além da porta, apagar o verbo reflexivo "preocupar-se" de todos os dicionários e escutar aquele CD. Ou aquele outro. Ou o que você preferir. Acho que vou estar prestando mais atenção nos seus sons. Me perco, sim, acho que me perco nos seus tudo. Você me põe de cabeça para baixo com todas as suas definições particulares e apimentadas. E só eu sei o quanto eu gosto disso. Vem aqui comigo e entra com a chave que eu vou deixar debaixo do tapete. Vem, porque eu estou esperando com os morangos e só. E vem daquele jeito seu que eu acho lindo.

Você se habilita? ..."

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Ivete Sangalo - Os Seus Botões - Elas Cantam Roberto



... " - Porque considero que influir sobre uma pessoa é transmitir-lhe um pouco de sua própria alma; esta pessoa deixa de pensar por si mesma, deixa de sentir as suas paixões naturais. Suas virtude não são mais suas. Seus pecados, se houver qualquer coisa semelhante a pecados, serão emprestados. Ela tornar-se-á eco de uma música estranha, autora de uma peça que não se compôs para ela. O fim da vida é o desenvolvimento da personalidade. Realizar a sua própria natureza- eis o que todos procuramos fazer. Os homens hoje, amedrontam-se deles mesmos. Esqueceram-se dos maiores de todos os deveres, do dever que cada um deve a si próprio. Naturalmente são caridosos. Nutrem o pobre e vestem os andrajosos, mas deixam as suas almas famintas e andam nus. A coragem nos abandonou; é possível que nunca a possuíssemos! O terror da sociedade, que é a base de toda moral, o terror de Deus, que é o segredo da religião- eis as duas coisas que nos governam."

Fonte: O Retrato de Dorian Gray. Oscar Wilde. Ed.Imago.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Raimundo Gadelha


Ato de contrição


Perdoe-me
por chegar assim, tão de repente
e encontrar-te assim, tão desprevenida

Perdoe-me
por não te dar tempo de me conheceres inteiro,
mas apenas o tempo inteiro tentar ser tudo aquilo
que – sei – tu gostarias que eu fosse

Perdoe-me
por tão subitamente adentrar teu corpo,
tenda, templo do espírito,
sem antes deter-me em cada detalhe
Bater à porta com suavidade
Encantar-me com os vasos na janela
Sentir todos os cheiros
e, devagar, ir penetrando com um sorriso

Perdoe-me
por, já dentro de ti, ter esquecido do essencial
Não ter percebido o quadro pendurado na parede
Não ter regulado o oxigênio dos peixes dourados no aquário
Não ter falado do retrato amarelado na mesa de cabeceira
Não ter me emocionado com o velho gramofone no canto da sala
e não ouvir as belas e tristes canções por ti sussurradas

Perdoe-me
por, ainda dentro de tua casa – tão próximo de tua alma –
não ter percorrido com brandura todos os cômodos,
mas apenas comodamente ter seguido meu próprio caminho

Perdoe-me
por, assim sozinho, tão impróprio ter sido,
quando melhor teria sido deixar que naturalmente fôssemos

Perdoe-me
por assim partir, deixando apenas inconsistência
em múltiplas formas de sonhos e esperanças

Perdoe-me, perdoe-me.


Raimundo Gadelha

sábado, 15 de agosto de 2009

Cesare Pavese


A Voz

Cada dia o silêncio do quarto isolado
se recolhe no leve marulho dos gestos
como o ar. Cada dia a estreita janela
se abre imóvel ao ar que se cala. A voz
rouca e doce não volta no fresco silêncio.

O ar imóvel se abre ao alento de quem
vai falar e se cala. É assim todo dia.
E a voz é a mesma,mas não rompe o silêncio,
rouca e igual como sempre na imobilidade
da memória. A clara janela acompanha
com sua breve batida o antigo sossego.

Cada gesto percute o antigo sossego.
Se soasse a voz, voltariam as dores.
Voltariam os gestos no ar espantado
e palavras, palavras à voz submissa.
Se essa voz ressoasse, até a breve batida
do silêncio que dura seria uma dor.

Voltariam os gestos das dore s inúteis,
percutindo nas coisas o estrondo do tempo.
Mas a voz não retorna, e o sussurro distante
não encrespa a memória. Imóvel a luz
relampeja serena. E o silêncio se cala
para sempre, submisso,na imagem antiga.

Adriana Calcanhoto


marítimo

pela orla
pela beira
pela areia afora
a tarde inteira
pela borda
pedra portuguesa

pelo Pepê
pelo Copa
pela costeira

pelo recorte do mapa
pela restinga
pela praia
até Marambaia
até onde vai a vista

no Posto Nove
a onda revolta
devolve o surfista

pelo Posto Nove
nove e meia
a onda branca preta branca preta
a praia vermelha
cobalto
no alto
no azul

marinho

a nuvem prata
a espuma pérola
a areia marfim

Gilberto Gil


É a sua vida que eu quero bordar na minha
Como se eu fosse o pano e você fosse a linha
E a agulha do real nas mãos da fantasia
Fosse bordando, ponto a ponto, nosso dia-a-dia

E fosse aparecendo aos poucos nosso amor
Os nossos sentimentos loucos, nosso amor
O ziguezague do tormento, as cores da alegria
A curva generosa da compreensão
Formando a pétala da rosa da paixão

A sua vida, o meu caminho, nosso amor
Você a linha, e eu o linho, nosso amor
Nossa colcha de cama, nossa toalha de mesa
Reproduzidos no bordado a casa, a estrada, a correnteza
O sol, a ave, a árvore, o ninho da beleza.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Chico Buarque

Os Paralamas do Sucesso


"...Cuide bem do seu amor
Seja quem for,
Cuide bem do seu amor
Seja quem for...

E cada segundo, cada momento, cada instante
É quase eterno, passa devagar
Se o seu mundo for o mundo inteiro
Sua vida, seu amor, seu lar
Cuide tudo que for verdadeiro
Deixe tudo que não for passar
Palavras duras em voz de veludo
E tudo muda, adeus velho mundo
Há um segundo tudo estava em paz...

domingo, 9 de agosto de 2009

Fernando Pessoa


"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia…... e se não ousarmos fazê-lo teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos."

Ivete Sangalo - Olha (Elas Cantam Roberto)

Frida Kahlo



"...Lo que importa es la no-ilusión. La mañana nace..."

sábado, 8 de agosto de 2009

Renato Russo



"Digam o que disserem, o mal do século é solidão
Cada um de nós imersos em sua própria arrogância,
Esperando por um pouco de afeição."

Gandi

"O amor é a força mais abstrata, e também a mais potente, que há no mundo."

Federico García Lorca



Eu pronuncio teu nome
nas noites escuras,
quando vêm os astros
beber na lua
e dormem nas ramagens
das folhas ocultas.
E eu me sinto oco
de paixão e de música.
Louco relógio que canta
mortas horas antigas.

Eu pronuncio teu nome,
nesta noite escura,
e teu nome me soa
mais distante que nunca.
Mais distante que todas as estrelas
e mais dolente que a mansa chuva.

Amar-te-ei como então
alguma vez? Que culpa
tem meu coração?
Se a névoa se esfuma,
que outra paixão me espera?
Será tranqüila e pura?
Se meus dedos pudessem
desfolhar a lua!!

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Ana Cristina Cesar


"... Acreditei que se amasse de novo
esqueceria outros
pelo menos três ou quatro rostos que amei...
organizei a memória em alfabetos
como quem conta carneiros e amansa
no entanto flanco aberto não esqueço
e amo em ti os outros rostos..."

Caio Fernando de Abreu


"... Uma tontura me subiu pela cabeça. De dentro das casas, das árvores
e das nuvens, as sombras e os reflexos guardados espiavam, esperando
que eu olhasse outra vez direto para o sol. Mas ele já tinha caído no rio. Durante
a noite os pontos de luz dormiam quietos, escondidos, guardados no meio das coisas.
Ninguém sabia. Nem eu..."

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Frida Kahlo


"...Algum tempo atrás, talvez uns dias, eu era uma moça caminhando por um mundo de cores, com formas claras e tangíveis. Tudo era misterioso e havia algo oculto; adivinhar-lhe a natureza era um jogo para mim. Se você soubesse como é terrível obter o conhecimento de repente - como um relâmpago iluminado a Terra! Agora, vivo num planeta dolorido, transparente como gelo. É como se houvesse aprendido tudo de uma vez, numa questão de segundos. Minhas amigas e colegas tornaram-se mulheres lentamente. Eu envelheci em instantes e agora tudo está embotado e plano. Sei que não há nada escondido; se houvesse, eu veria..."

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Calvin



Rubem Alves

“Esperança é quando, sendo seca absoluta do lado de fora, continuam as fontes a borbulhar dentro do coração”.

Carlos Drummond de Andrade

A chuva me irritava.
Até que um dia descobri que maria é que chovia.
A chuva era maria.
E cada pingo de maria ensopava o meu domingo.
E meus ossos molhando, me deixava
como terra que a chuva lavra e lava.
Eu era todo barro, sem verdura...
maria, chuvosíssima criatura!
Ela chovia em mim, em cada gesto,
pensamento, desejo, sono, e o resto.
Era chuva fininha e chuva grossa,
matinal e noturna, ativa...Nossa!
Não me chovas, maria, mais que o justo
chuvisco de um momento, apenas susto.
Não me inundes de teu líquido plasma,
não sejas tão aquático fantasma!
Eu lhe dizia em vão - pois que maria
quanto mais eu rogava, mais chovia.
E chuveirando atroz em meu caminho,
o deixava banhado em triste vinho,
que não aquece, pois água de chuva
mosto é de cinza, não de boa uva.
Chuvadeira maria, chuvadonha,
chuvinhenta, chuvil, pluvimedonha!
Eu lhe gritava: Pára! e ela chovendo,
poças dágua gelada ia tecendo.
Choveu tanto maria em minha casa
que a correnteza forte criou asa
e um rio se formou, ou mar, não sei,
sei apenas que nele me afundei.
E quanto mais as ondas me levavam,
as fontes de maria mais chuvavam,
de sorte que com pouco, e sem recurso,
as coisas se lançaram no seu curso,
e eis o mundo molhado e sovertido
sob aquele sinistro e atro chuvido.
Os seres mais estranhos se juntando na mesma aquosa pasta
iam clamando contra essa chuva estúpida e mortal
catarata (jamais houve outra igual).
Anti-petendam cânticos se ouviram.
Que nada! As cordas d’água mais deliram,
e maria, torneira desatada,
mais se dilata em sua chuvarada.
Os navios soçobram.
Continentes já submergem com todos os viventes,
e maria chovendo.
Eis que a essa altura, delida e fluida
a humana enfibratura,
e a terra não sofrendo tal chuvência,
comoveu-se a Divina Providência,
e Deus, piedoso e enérgico, bradou:
Não chove mais, maria! - e ela parou.
(Carlos Drummond de Andrade)

domingo, 2 de agosto de 2009

Caio Fernando Abreu


"...A vida é agora, aprende. Ainda outra vez tocarão teus seios, lamberão teus pêlos, provarão teus gostos. E outra mais, outra vez ainda. Até esqueceres faces, nomes, cheiros. Serão tantos. O pó se acumula todos os dias sobre as emoções..."

Adriana Calcanhoto


“Depois de ter você poetas para quê?”

Cristiana Guerra


"...Uma sensação de estar só, um sentimento de não ser. Até entender que eu estava mesmo era em minha boa companhia. Mas ela se ausenta, vez por outra. E assim se seguiu a vida: a me mostrar que eu não iria pela boa e velha estrada. Eu pegaria os atalhos..."

sábado, 1 de agosto de 2009

Milan Kundera


"...Com as outras mulheres ele nunca dormia. (…) Portanto, qual não foi sua surpresa quando acordou com Tereza segurando firmemente sua mão! Olhou-a e custou a compreender o que estava acontecendo. Evocou as horas que tinham se passado e acreditou respirar o perfume de uma felicidade desconhecida. (…) Tomas pensava: deitar-se com uma mulher e dormir com ela, eis duas paixões não somente diferentes, mas quase contraditórias. O amor não se manifesta pelo desejo de fazer amor (esse desejo se aplica a uma série inumerável de mulheres), mas pelo desejo do sono compartilhado (este desejo diz respeito a uma só mulher)..."


Trecho de " A insustentável Leveza do Ser"

Legião Urbana


"... Mesmo se as estrelas
Começassem a cair
A luz queimasse tudo ao redor
E fosse o fim chegando cedo
Você visse o nosso corpo
Em chamas!

Quando as estrelas
Começarem a cair
Me diz, me diz
Pr'onde é
Que a gente vai fugir?