sábado, 15 de agosto de 2009

Cesare Pavese


A Voz

Cada dia o silêncio do quarto isolado
se recolhe no leve marulho dos gestos
como o ar. Cada dia a estreita janela
se abre imóvel ao ar que se cala. A voz
rouca e doce não volta no fresco silêncio.

O ar imóvel se abre ao alento de quem
vai falar e se cala. É assim todo dia.
E a voz é a mesma,mas não rompe o silêncio,
rouca e igual como sempre na imobilidade
da memória. A clara janela acompanha
com sua breve batida o antigo sossego.

Cada gesto percute o antigo sossego.
Se soasse a voz, voltariam as dores.
Voltariam os gestos no ar espantado
e palavras, palavras à voz submissa.
Se essa voz ressoasse, até a breve batida
do silêncio que dura seria uma dor.

Voltariam os gestos das dore s inúteis,
percutindo nas coisas o estrondo do tempo.
Mas a voz não retorna, e o sussurro distante
não encrespa a memória. Imóvel a luz
relampeja serena. E o silêncio se cala
para sempre, submisso,na imagem antiga.

Um comentário:

A.S. disse...

Mari...

A voz do silêncio revela-nos sempre sensações maravilhosas!...


Beijos!