quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Wally Salomão


POST-MORTEM

"Um cavalo-marinho mergulha em seus círculos de corais

mas em sua mente só revela a atualidade do belo.

O passado pode estar abarrotado de chateações

mas daqui pra frente ótimas fotos e melhores filmes

e amor e gravidez no bojo do macho

e horas infindas deitado nas areias

especulando nuvens

que se esgarçam ao sabor e ao deslize das figuras.

Um gosto permanecer aqui extasiado

e sem querer comparecer a nenhum vernissage

cansado dos artistas

que dão aos seus quadros a última demão de verniz

e permanecer lasso das exposições e dos museus a visitar

e do dernier cri

esquecer os pacotes de encomendas à Amazon Books

e fugir dos seminários sem sêmen nem humor trocadilhescos.

Quase morrer é assim:

uma cada vez crescente ojeriza com a "vidinha literária"

de par com a imorredoura memória de certas linhas,

por exemplo,

que durante o resto de tempo que me é concedido viver

e na hora H da morte,

estampada na minha face esteja a legenda:

O que amas de verdade permanece, o resto é escória.

Sonhar com Provenças e Venezas e Florenças.

Rever Piero della Francesca

e a Essaouira de meu amigo Garbil, o boxeador.

E a vista de Delft de Vermeer.

A Barcelona do poeta-clochard-palhaço Joan Brossa.

A cena de New York, minha e de todos e de Ashbery

e de Frank O'Hara e de ninguém.

Sobem fiapos da infância de um tabaréu:

ora eu era

uma piaba nadando por entre bancos de areia do Rio das Contas

ora eu era

um acari das locas do Gongogi - rio cheio de baronesas.

Idade de ouro fluvial, plástica, flamante.

Fogueira gigante das noites de São João. Fogos-de-bengala.

Eu sozinho menino e o Amadis de Gaula

e os outros todos principais cavaleiros

e as outras todas principais damas

que povoavam as varandas, os pastos,o curral,a balsa, a chácara,

as pedras,os capins e as matas da Coroa Azul do raro Balito.

Convive-se com uma criatura sem imaginar sequer de que reino provém.



Zelar pelo deus Treme-Terra que meu coração devolveu.

Não cortejar a morte.

Não perambular pelos cemitérios

nem brindar o luar patético

com caveiras repletas de vinho tinto seco

como um Byron-Castro Alves gótico e obsoleto.

Sereno e cabeça dura - testa ruda -

mirar de frente da caveira

e as tropas de vermes de prontidão

(como observo vermes dentro de um pêssego)

Mas por enquanto gargalhar da irrealidade da morte.

Gozar,gozar e gozar

a exuberância órfica das coisas

em riba da terra

debaixo

do

céu."

Um comentário:

Raquel nogueira disse...

Mew Deus que lindo agradeço muito as suas visitas ao meu blog são muio sinceras e as adoro adoro seu blog as palavras doces o que tenta passar por trás das palavras parabéns é ótimo adoro ...!!!